No prólogo de seu livro em que analisa o teatro pós-dramático, Hans-Thies Lehmann (2007) refere-se às diferenças entre as práticas culturais tecnológicas e midiáticas, que se tornam cada vez mais “imateriais”, e o teatro, definido por uma “materialidade da comunicação”. O autor inclui nessa última todos os recursos, pessoas e equipamentos necessários à execução do espetáculo ao vivo e presencial. Nessa direção, o teatro subsiste numa situação mais frágil por não circular e ser passível de comercialização no mesmo patamar de seus concorrentes. Pode-se perguntar, a partir desse quadro, o que caberia ao teatro no mundo contemporâneo?
O tempo como experiência direta, como o sensível sobre o qual se opera a composição no instante. Pois foi na abordagem das velocidades e lentidões, da duração e da repetição, que encontrei as entradas para uma dramaturgia de estados (passagens para o plano das intensidades). Isso ocorreu ao mesmo tempo em que o desenvolvimento dramático deixou de se impor às criações corporais em flutuação e que emergiram das oficinas e cursos de improvisação. Um pensamento que se faz, igualmente, provocador da própria mise en scène.
E tão aliado quanto provocador dessa deflagração corpórea flutuante, o tempo tornou-se um fluxo operatório e expressivo – um caminho compositivo. Acrescente-se a esse espectro a questão do tempo como elemento que dialoga com o performador – como um co-atuante.
Começo, então, pela seguinte pergunta: qual a estruturação ontológica da experiência do tempo de uma determinada performace?
Há um teatro de estados. Ou, melhor, teatros. E para trazer alguns elementos sobre o tema, selecionei trechos de dois textos. O primeiro é de Eduardo Pavlovsky, dramaturgo, ator, diretor, ensaísta e psicoterapeuta. O segundo é de Jorge Dubatti. São ensaístas argentinos que poderiam estar mais presentes em nossa cultura cênica. E também em nosso aporte teórico do teatro contemporâneo. Os autores abordam um campo de experimentação que não se pauta pela representação. E o fazem utilizando as ferramentas conceituais que buscam desmontar as concepções representacionais. O mesmo digo para os estudos da pesquisadora cubana, radicada no México, Ileana Diéguez, sobre as teatralidades liminares. Ela afirma, por exemplo, que é necessário “problematizar a representação como espaço de diferenças”. Nesse caso, Ileana diz que “a arte atual, particularmente o teatro, deveria considerar as reflexões traçadas pela teoria pós-estruturalista”.
No caso em tela, Eduardo Pavlovsky e Jorge Dubatti utilizam conceitos extraídos da filosofia de Gilles Deleuze e Félix Guattari. Mas não acredite que se trata de uma adequação de um pensamento criativo a outro. Pois a arte, sim, ela pensa por seus próprios meios, dirá Deleuze.
Os dois textos abordam o “teatro de estados” não de um modo geral, mas sim nos processos de singularização do teatro de Ricardo Bartís. Vamos aos nossos ensaístas: